sábado, agosto 09, 2008

MEMÓRIAS DE UM SEQÜESTRADO POR TERRORISTAS

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Domingo, dia 2/3, O Globo publicou uma entrevista com um terrorista seqüestrador Tupamaro, que foi um dos algozes de meu avô embaixador Aloysio Gomide quando ele foi seqüestrado em 1970. Ficamos indignados pelo tom de saudosas e casuais reminiscências de um passado remoto, como se fosse sobre algo que hoje seria tratado como quase uma mera infantilidade. Indignado, o genro de Gomide escreveu uma carta para o jornal, que foi publicada no dia 05/03/2008. Vejam o que ele escreveu:

Senhor Redator,

Com relação ao artigo de domingo 02 de março, "Memórias de um seqüestro que abalou Brasil e o Uruguai", a aparentemente simpática e singela estorinha do contador David Cámpora , seqüestrador e terrorista aposentado, convenientemente omite que meu sogro, o Embaixador Aloysio Gomide, foi violentamente arrancado do convívio dos seus e que, para tal, ainda ameaçaram seu filho de três anos com uma arma na cabeça. Recebeu coronhadas, foi drogado e levado a seus cativeiros, todos eles subterrâneos, permanecendo por sete meses de pijama, trancado em um cubículo com paredes forradas com jornais e infestado de baratas, sem ver a luz do sol.

Sofreu dois fuzilamentos simulados, e era constantemente ameaçado de morte por seus carcereiros.

Sua libertação foi resultado da intensa campanha realizada por minha sogra, Dona Apparecida Gomide, uma dedicada dona de casa e mãe de família que, tirando forças não se sabe de onde, saiu à luta por seu marido. Com a ajuda dos apresentadores Flávio Cavalcanti e Abelardo Barbosa, o Chacrinha, e outros amigos, antigos e novos, conseguiu levar seu desesperado grito por socorro ao povo brasileiro. Mulher religiosa e destemida, jamais esmoreceu na intransigente defesa de seu marido, sendo importuna e inconveniente com Ministros de Estado e com outras autoridades do governo de então, no Brasil e no Uruguai, mesmo com o Presidente Médici. Sua presença e insistência, constante e veemente, era um problema para aqueles que queriam esquecer a situação de seu marido. Alguns conhecidos faziam o possível para evitar serem vistos com ela em face da repercussão do caso.

Por sua conta fez contatos com os seqüestradores. O resgate foi pago com as generosas contribuições do povo brasileiro, inclusive dos mais humildes, e com as parcas economias de uma família de classe média com seis filhos pequenos. O dinheiro foi recolhido, transportado e posto nas mãos dos terroristas por leais amigas de D. Apparecida.

Durante seus sete meses de cativeiro meu sogro, em estrita honra a seu dever de diplomata brasileiro, jamais se manifestou em contra de seu governo, apesar de constantemente instado e ameaçado por seus seqüestradores. Pude ler as cartas da época à sua mulher. Sabedor que a morte o esperava, pois seu companheiro de cela Dan Mitrione fora assassinado, preocupava-se muito com a situação de sua família sem a sua presença.

Homem profundamente religioso, jamais foi acometido pela desesperança ao longo dos sete meses de seu cativeiro subterrâneo. Seu silêncio, mesmo depois de 37 anos, é o protesto de alguém que superou a barbaridade que lhe foi imposta e que prefere recolher-se ao seio de sua família, em vez de manifestar sua indignação quando terroristas da época são tratados como heróis por representantes do povo que pagou por seu resgate. Por exemplo, quando a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro homenageou, em meados dos anos 80, o terrorista-chefe dos Tupamaros, Raul Sendic.

É ultrajante que parte de nossa história seja esquecida, omitida ou convenientemente deturpada para se adequar à torta ideologia em moda. Fatos são orwellianamente "ajustados" para criar uma realidade alternativa. Quando vítimas, alegadas vítimas e pseudo-vítimas da ditadura estão sendo compensadas com indenizações milionárias e com generosas pensões - com direitos até para não nascidos - como ficam os que sofreram as conseqüências do terrorismo?

Por esses motivos, a bem de esclarecer as novas gerações sobre a realidade do ocorrido, ou pelo menos para que tenham uma pontada de dúvida ao ler relatos históricos de terroristas, é que evidencio esses fatos.

Atenciosamente,

José Ricardo da Silveira

Foz do Iguaçu

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