sexta-feira, agosto 15, 2008

O capitão de longo curso

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Belmiro Valverde Jobim Castor

professor do doutorado em Administração da PUCPR.

15/06/2008

Jorge Amado criou um personagem delicioso em Os Velhos Marinheiros, o comandante Vasco Moscoso de Aragão, que se apresentando como capitão de longo curso, surge em uma pequena cidade do litoral baiano fardado, carregando mapas, bússola, cachimbo e telescópio. O recém-chegado deslumbra a população com narrativas de viagens nos sete mares, naufrágios, perigos, borrascas e decisões heróicas tomadas em ocasiões dramáticas, mulheres loucamente apaixonadas e inesquecíveis jogos de pôquer a testar os nervos de aço. Mas tudo não passava de invencione, como descobre seu desafeto Chico Pacheco, fiscal aposentado.

Por artes do destino, o comandante Vasco Moscoso de Aragão acaba sendo chamado a substituir um comandante de verdade em um navio costeiro e logo a tripulação percebe sua ignorância, embora os passageiros se maravilhem com seu aplomb e suas narrativas heróicas e saborosas. O tempo ajuda e a viagem corre sem sobressaltos até a chegada ao porto de destino, em que os tripulantes pregam uma peça no comandante para desnudar a sua total ignorância em relação às coisas do mar e desmoralizá-lo diante dos passageiros. O final eu não conto para não infringir os direitos autorais...

O governo do presidente Lula se assemelha ao navio do comandante Vasco Moscoso de Aragão. Até pouco tempo o mar estava calmo, os ventos favoráveis, com a economia do mundo crescendo, a demanda pelos produtos agrícolas e as commodities minerais brasileiras disparando e com preços alcançando níveis recordes, a inflação interna domada em patamares tranqüilos. Superávits comerciais volumosos e dólares atraídos por uma taxa de juros interna altíssima, abarrotaram as reservas internacionais brasileiras, o PIB cresceu mais do que o esperado, o crédito se expandiu e milhões de pessoas passaram a comprar carros, casa própria, bens duráveis. Mar de almirante, céu de brigadeiro.

Com tanto sucesso, nosso comandante corre o país esbanjando otimismo, feliz com o próprio desempenho, engrandecendo os próprios feitos e ironizando os fracassos dos antecessores. A narrativa de suas aventuras encanta os passageiros, especialmente os mais simples. Enquanto isso, o navio comandado por ele, gasta a mancheias para multiplicar o estoque de benesses imediatistas, e mostra pouca preocupação com o desperdício e a cupidez de alguns dos tripulantes. A confiança na própria popularidade entre os passageiros é tanta que até quando os companheiros de tripulação se envolvem em assuntos malcheirosos e mal explicados, ele se apressa a estender a mão amiga da compreensão e oferece uma pronta justificativa para inocentá-los.

Então, o tempo começou a mudar e o mar já não está tão calmo assim. Petróleo a US$ 130 o barril e a crise financeira americana ameaçam provocar uma recessão na economia mundial. O preço do óleo e a pressão da demanda vêm provocando aumentos nos custos de produção agrícola no mundo todo, inclusive no Brasil, fazendo com que os preços dos alimentos sigam subindo sem cessar. As metas de inflação do Banco Central, antes cumpridas com facilidade, estão agora sendo ultrapassadas mês a mês e o Bacen reage fazendo o que sabe fazer melhor, ou seja, aumentando os juros para tentar conter a demanda. Com isso esfria a economia e, de quebra, pressiona o déficit público pois o governo é quem mais deve no país e portanto o que mais paga juros. Dissemina-se entre os agentes econômicos a expectativa de que a inflação suba, o que faz com que ela suba mesmo, como conseqüência das chamadas profecias auto-realizantes, as self-fulfilling prophecies.

Nuvens carregadas se acumulam na rota do navio do comandante Vasco Moscoso de Aragão. Vamos ver como se comportará o bravo lobo do mar, enfrentando a procela em seu furor, como diz o cordel nordestino.

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