sábado, agosto 09, 2008

Exercício do poder

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Jarbas Passarinho
JB
20 Nov 2007

O presidente Lula, a respeito do incidente criado pelo caudilho Chávez, na Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, retrucou aos que acham a Venezuela uma ditadura, dizendo: "O que importa, independente do regime, é o exercício do poder". Quando regressou da China, disse o mesmo. Governada por um só partido, o Comunista, transgride princípios fundamentais do marxismo: acolheu o capital estrangeiro para o seu desenvolvimento, retirou da sua Constituição a abolição da propriedade privada, contrastando com o que Marx e Engels escreveram no Manifesto Comunista de 1848: "A teoria dos comunistas pode ser sintetizada numa sentença, a abolição da propriedade privada". O poder é mantido pelo "socialismo de mercado", sem respeito pelas liberdades fundamentais, políticas e sociais. Os milhares que pediam regime democrático foram massacrados na Praça da Paz Celestial. Aí está uma interpretação do exercício do poder, flexível ou rígido, independente do regime.

Em Pernambuco, em 1963, disse Prestes a Arraes, que o homenageava: "Nós, comunistas, estamos no governo (de João Goulart), mas ainda não estamos no poder". Faltou-lhes o que no jargão marxista chama-se de "condições objetivas".

A Venezuela é conhecida como um país rico e um povo pobre, uma condição objetiva para a "revolução bolivariana". Chávez aproveitou-se dela. Deu aos pobres a preta (cartão de benefício do petróleo, semelhante ao da Bolsa Família). Mandou seu povo "ler Marx e Engels". Proclamou o "socialismo do século 21". Ampliou o número de ministros da Corte Suprema e nomeou chavistas que lhe garantiram a maioria. Dominando os órgãos fiscalizadores das urnas, marcou eleição de que a oposição não participou, em protesto por saber que seria fraudada. O Congresso, todo chavista, promulgou nova Constituição, em 1999. Submeteu-a a um referendo popular, que a aprovou. Amordaçou a imprensa, com uma lei que criminaliza quem atacar o presidente. Cassou a RCTV, de maior audiência, que lhe fazia críticas. Considerando, porém, que "os avanços não tinham sido suficientes para alcançar a felicidade do povo", reformou a Constituição, submetendo-a a outro referendo.

Só um punhado de próprios chavistas votou contra, dizendo ser um golpe que perpetua Chávez na Presidência e dá-lhe autoridade para intervir na propriedade privada. Entre eles, o general Isaías Baduel, decisivo como comandante das tropas de Maracaibo, para o retorno de Chávez à Presidência, deposto por um golpe de Estado. Ao discursar contra no Congresso, foi chamado de fascista e traidor. Estudantes voltando de manifestação contrária à aprovação do referendo foram recebidos por chavistas armados e encapuzados, que feriram oito deles. Submissos a ele, o Legislativo e o Judiciário, as pretas distribuídas com o dinheiro do petróleo, a imprensa livre eliminada, a mídia amordaçada ou cassada e apoiado por militares seus apaniguados, é certo que o referendo vencerá pelo medo da represália. No exercício do poder, Chávez usa os referendos e os plebiscitos - meios democráticos - para acabar com a democracia, legitimando a tirania.

Este sumário histórico, fundamentado nos fatos, faz estranhar o desagravo a Chávez, prestado pelo presidente Lula, no episódio em que o caudilho foi admoestado pelo rei Juan Carlos, da Espanha, devido à sua logomaquia insólita. Um deputado maranhense do PCdoB argumenta que não cabe ao Congresso definir se outro país é ou não democrata. Definir, concordo, mas evitar sua companhia quem exige é a lei em que se baseia o protocolo do Mercosul. Por isso, é que Lula define "a Venezuela como um país democrático". E aduz "até demais", uma advertência, que induz ter a democracia restrição e limites de natureza pessoal. De resto, se aprovados emenda constitucional ou referendo à emenda, propostos por deputados petistas, Lula poderá ter um terceiro mandato "democraticamente". Mas se acha que o rodízio no poder "é democracia demais", talvez tenha sido um ato falho de nosso presidente.

Inclino-me a pensar que o Brasil de hoje, a Bolívia, de Evo Morales, e o Equador, de Correa, desejam imitar a "democracia" de Chávez. Todos eles são da mesma Igreja dos plebiscitos e referendos. Solidários com tudo o que um deles fizer, inclusive Lula, como se deu com Chávez, são todos, como ele dizia no passado, dos partidos políticos brasileiros, "farinha do mesmo saco".

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