quinta-feira, agosto 14, 2008

O BRASIL E A TRIPOLARIDADE DE PODER NO SÉCULO XXI

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Disponibilizado no Monitor Mercantil Digital

em 11/02/2008 e publicado no Monitor Mercantil de 12/02/2008

EDUARDO ITALO PESCE (*) e IBERÊ MARIANO DA SILVA (**)

A guerra de quarta geração (G4G) é caracterizada pela perda do monopólio do Estado sobre os conflitos armados. As guerras do Século XXI tendem a ser conflitos “não-westfalianos”, podendo incluir a participação de atores não-estatais, como grupos terroristas ou organizações criminosas transnacionais.

O advento da G4G, assim como a globalização financeira, contribuiu para enfraquecer os Estados nacionais, especialmente os localizados na periferia do sistema internacional. Os Estados mais fortes continuam a dispor de poder suficiente para imporem sua vontade aos mais fracos.

A América Latina e a América do Sul ocupam posição periférica, no sistema mundial de distribuição de poder. O Brasil possui a maior economia da região, com cerca de metade do PIB combinado da América do Sul, mas a evolução de sua capacidade de dissuasão e defesa não acompanhou a da economia.

Há os que afirmam que “a América do Sul é o mais desarmado dos continentes e assim deve permanecer”. Há também os que acreditam que o pouco envolvimento dos países sul-americanos em conflitos internacionais, no Século XX, foi resultado do relativo isolamento geopolítico da região, desde o final do século anterior.

Segundo Parag Khanna, o “momento unipolar” do pós-Guerra Fria estaria sendo substituído por uma nova tripolaridade econômica e militar, com três superpotências: Estados Unidos, União Européia e China. Esta visão geopolítica lembra um pouco o mundo idealizado por George Orwell, no livro “1984”.

Cada uma das superpotências do Século XXI teria sob sua influência hegemônica uma “pan-região” do globo terrestre. Assim, as Américas estariam sob hegemonia dos EUA, enquanto que a África estaria na área de influência da Europa e a Ásia (ou a maior parte dela) na da China.

Além do “Primeiro Mundo”, integrado pelas três superpotências, a nova visão tripolar incluiria um “Segundo Mundo”, constituído por potências médias (capazes de influenciar o equilíbrio de poder), e um “Terceiro Mundo”, integrado pelos países periféricos (sem influência significativa sobre o sistema). Haveria assim um centro, uma semi-periferia e uma periferia, com características distintas.

O Segundo e o Terceiro Mundos estariam geograficamente dispersos pelas pan-regiões. Entre os países-chave do Segundo Mundo, estariam a Rússia (localizada entre a Europa e a Ásia), a Índia (na Ásia Meridional) e o Brasil (maior país da América do Sul e terceiro das Américas).

Por sua extensão e diversidade, estes três países apresentam um quadro econômico heterogêneo, com regiões altamente desenvolvidas e outras mais atrasadas. No futuro, as pressões sociais resultantes de tais diferenças podem até resultar em fragmentação, se os governos centrais não conseguirem administrá-las.

No Brasil, as políticas de “Estado mínimo”, postas em prática por diversos governos desde o final dos anos 80, resultaram no sucateamento da máquina pública e no enfraquecimento do Estado nacional. Entre os setores sucateados, encontram-se as Forças Armadas, essenciais para a defesa da soberania e da integridade nacionais.

A superioridade militar brasileira na América do Sul está ameaçada. A substituição do “desequilíbrio estável”, favorável ao Brasil, por uma situação de “equilíbrio instável”, seria potencialmente desestabilizadora, pois nosso país, que não tem ambições expansionistas, sempre exerceu um papel moderador no subcontinente.

Em setembro de 2007, foram iniciados estudos visando à elaboração de medidas para reverter tal tendência. Espera-se que o governo não fique apenas na intenção e realize os investimentos necessários à modernização da defesa nacional. O fim da CPMF não pode servir de desculpa para o cancelamento de programas e projetos nessa área.

No final de janeiro de 2008, durante visita oficial do ministro da Defesa do Brasil à França, foi assinado um acordo de cooperação militar entre os dois países. As possíveis conseqüências de tal acordo devem ser cuidadosamente analisadas. A tentativa de firmar acordo semelhante com a Rússia não obteve sucesso.

A diversificação de parcerias e alianças faz parte da “diplomacia pendular” das potências médias, num sistema com três ou mais pólos de poder. A aproximação entre Brasil e União Européia poderia alterar o quadro estratégico na América do Sul, onde China e EUA aparentemente já têm aliados preferenciais.

FIM

(*) Especialista em Relações Internacionais, professor no Centro de Produção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CEPUERJ) e colaborador permanente do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Escola de Guerra Naval (CEPE/EGN).

(**)General-de-brigada engenheiro militar na reserva, pós-graduado pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) e pela École Nationale Supérieure de l’Aéronautique et l”Espace (França) e diplomado no Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército (CPEAEx).

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