sábado, agosto 09, 2008

LIDERANÇA VIRTUAL OU RACIONAL?

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Por Antonio Celente Videira

Cel. Int. R1 Aer.

Membro do Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra (ESG)

E-mail: acelente@terra.com.br

Uma das maiores crises que se vive nesse alvorecer de Terceiro Milênio é a ausência da autêntica liderança.

Vejam que a corrupção, a falta de ética, o desvio psicológico são decorrentes da escassez desse atributo nos profissionais, cuja tradição deveriam estar investidos do mesmo.

O militar do alto escalão, o funcionário público em funções relevantes do estado e o empresário vivem à míngua da liderança. A liturgia do cargo é o que ainda os mantêm à testa das fileiras hierárquicas.

Talvez a Era da Cibernética seja uma das maiores culpadas desse desarranjo.

A tela do computador tornou-se o espelho mágico dos nossos chefes. Eles se comportam como se fossem a rainha-feiticeira do conto da Branca de Neve e os Sete Anões, os quais ao invés de perguntarem: “espelho meu, espelho meu; existe alguém mais bonito do eu?”, preferem usar o seguinte mantra matinal: “máquina minha, máquina minha; existe mais e-mail hoje do que tinha?”. A partir daí engolfam-se no turbilhão de comunicados do ciberespaço.

A navegação nos blogs, a leitura encantadora dos e-mails, a garimpagem de notícias ou lindas mensagens para posterior remessa aos que compõem o seu banco de internautas, a magicidade dos efeitos especiais somados a facilidade em montar uma palestra em Powerpoint, tornaram-se o visgo sedutor que fazem dos nossos chefes prisioneiros de um mundo virtual. Flash Gordon, em suas aventuras, no foguete do Dr. Zarkov, e o Capitão Kirk, em Jornada nas Estrelas, no interior da Enterprise, não fixavam seus olhares nas imagens dos televisores daquelas naves, da mesma forma que nossos “líderes virtuais” o fazem diante do espetacular mundo cibernético.

Imaginem, queridos leitores, vocês se deparando com um coronel, comandante de organização militar ou com um diretor-executivo de uma grande empresa, concentrados, fazendo palavras cruzadas ou rezando um rosário (terço católico), em suas respectivas salas da empresa. Com toda certeza, os senhores ficariam estupefatos. No entanto, quando aqueles mesmos atores estão envoltos com as “baboseiras” da internet, em um sofisticado terminal LCD, não lhes causa espanto.

Essa é a atual nostalgia do comandamento. O fascínio e o encantamento ciberespacial estão preterindo a presença do “líder virtual” junto à tropa e à linha de produção.

Como fazem falta os velhos capitães da antiguidade! Júlio César, Alexandre Magno, Cipião, Aníbal, Napoleão e outros, de cima de seus cavalos, observavam com sobriedade seus exércitos, ao invés de ficarem encantados com o monitor computacional, relegando, a segundo plano, as angústias de seus liderados.

O chão-de-fábrica, palco das relações de liderança do executivo sobre o trabalhador, na Era Industrial, período marcante do surgimento da Administração de Taylor, Fayol e Ford, transformou-se nos corredores desertos das fábricas atuais, cujo operador da máquina-computador pouco ou nunca vê o chefe.

Para Peter Drucker, o “executivo-chefe heróico”, excede os limites normais da capacidade humana. Concluía aquele mago da gestão alegando que “quatro tipos diferentes de pessoas são necessárias para desempenhar o papel de executivo-chefe: o homem de pensamento, o homem de ação, o homem de pessoas e o homem de liderança”. (Heller, 2007)

Já Alfred Sloan, gênio da organização e guru de Peter Drucker, quando reestruturou a General Motors (GM), nos anos 20, disse: “Se não gastássemos quatro horas colocando um homem no lugar certo, gastaríamos quatrocentas corrigindo nossos erros”.

A atenção desses homens para com seus subalternos era algo admirável.

Fala-se muito hoje que não há vácuo do poder. A ausência da autoridade pública em áreas estratégicas, como por exemplo, nas comunidades carentes metropolitanas e nos espaços amazônicos, gerou a instalação do crime organizado nas primeiras e a fixação de suspeitas Organizações Não Governamentais (ONG) nos segundos, gerando grandes problemas sociais. Isso se deveu, na grande maioria destes casos, a insensibilidade de chefes que, ainda nos anos 50, não deram a mínima importância aos informes ou não leram os simples relatórios de seus subordinados, caracterizando o alheiamento do líder.

Mas naquela época, apesar dos computadores de primeira geração estarem chegando ao cenário mundial, e, portanto, não atraírem os donos de cargos, outro meio os deslumbravam. Estamos falando da mídia escrita, falada e televisiva, que iria trazer a informação às lideranças, cativando-as e neutralizando suas atitudes de pensar. Iniciava-se, desta forma, o período do chefe conhecedor da história e da informação e esvanecia o tempo do homem principal que protagonizava os acontecimentos e os fatos, mas meditava sobre suas atitudes em relação àqueles que lhes seguiam e ao ambiente que o circundava.

Nizan Guanaes, dono de uma das maiores agências publicitárias brasileiras, ADM9, sentenciou em seu discurso a uma turma de formandos em publicidade, que serve para o executivo-espectador: “Ao invés de observar os acontecimentos do cotidiano, os quais reclamam a sua intervenção, pense que cada homem foi feito para fazer história. Que todo homem é um milagre e traz em si uma revolução... Você foi criado para construir pirâmides e versos, descobrir continentes e mundos, e caminhar sempre com um saco de interrogações na mão e uma caixa de possibilidades na outra”.

A contribuição de Nizan Guanaes leva-me a conclamar ao “líder virtual” que deixe de lado o “mouse” e utilize mais o “teclado” do seu computador, e saia do seu “bureau” e vá à linha-de-frente, pois desta forma terá oportunidade em ousar, errar, falhar e lutar, transformando-se, assim, no “líder racional”. O “ciberespaço” é a arena de outrora que lhe possibilita tornar-se no “novo gladiador” do mundo dos negócios, adormecendo-lhe o “eunuco administrativo” da corte.

James Hunter, autor do Best-Seller “O Monge e o Executivo”, na sua obra “Como se Tornar um Líder Servidor” narra que “nos EUA existem cerca de 2,5 milhões de profissionais com diploma de MBA (Master in Business Administration) e que a maioria se preocupa apenas em impressionar todos com seus vistosos certificados e vasto conhecimento, demonstrando, inclusive, capacidade para administrar, mas são incapazes de liderar”.

James Hunter complementa de forma hilariante expressando “se um visitante de Marte, algum dia, desembarcasse nos EUA e pedisse que o levasse a um líder, não se saberia para onde levá-lo”.

Conclui-se que é mais fácil ter contato do terceiro grau com um extraterreno do que cruzar com um executivo possuidor de carisma.

O bastão de comando de alguns militares de alta patente foi substituído pelo computador e a agenda de anotações de tantos outros CEO (Chief Executive Officer) foi trocada pelo laptop. É o início da navegação em mares revoltos, cujos ventos não se entrechocam com as velas alinhadas e coordenadas da embarcação, com o propósito de deixá-la no porto mais conveniente.

O reflexo disso tudo são anomalias percebidas em ditas lideranças políticas no Rio de Janeiro, quando um prefeito se preocupa com o excelente “design” do seu blog, atraindo elevado número de leitores, ao invés de melhorar a cidade em infra-estrutura, motivo pelo qual foi eleito. Mas não muito longe dele, vê-se um governador, autoridade máxima do Estado, que se nega a comparecer à parada cívica da independência do Brasil, no dia 7 de setembro, não pisando no palanque oficial das autoridades para, logo a seguir, duas semanas depois, subir no carro alegórico das bonecas, na Avenida Atlântica, em Copacabana, no sensacional “desfile gay”.

Essa é a crua realidade, cuja ambiência propicia o surgimento dos aventureiros medíocres, com liderança negativa, eclipsando o homem de bem, por não ter habilidade em se impor tornando-se guia de cidadãos ávidos pelo crescimento econômico, pela paz e pela justiça social.

Não pense os leitores que se está fazendo proselitismo contra o que a informática tem trazido à humanidade e em especial à ordenação do Mundo. O advento da imprensa, do telégrafo, do telefone, do rádio, da televisão e a revolução dos transportes impactaram positivamente a Raça Humana e a Gestão Administrativa. Da mesma forma, a Tecnologia da Informação trouxe outras transformações.

O chefe-executivo que quer auto-investir-se do atributo da liderança não pode sofrer de cibercondria (dependência do computador). O binômio informática/internet deve ser canalizado visando a pesquisa, a rápida e prática comunicação no mundo globalizado, a modelagem de cenários, a facilitação na tomada de decisão diante de tendências de multicritérios e a escolha da melhor estratégia na guerra de quarta geração, dentre outras possibilidades.

É por isso que rendo minha homenagem ao advento do computador, como elemento alavancador do desenvolvimento dos povos, citando expoentes da literatura estratégica atual e suas maneiras como enxergam a Era da Cibernética. Alvim Toffler a chamou de “A Terceira Onda”, Thomas Friedman a classificou de “o Mundo é Plano”, Herman Kahn em “a Idade da Automação”, Hugh Hewitt a designou como “Blogosfera” e, para não se ir mais além, Fritjof Capra a mencionou como “a Teia ou Rede da Vida”.

O autor desta lavra preferiu chamá-la de “Távola Redonda”, por entender que todos estamos conectados espiritualmente e agora virtualmente. É por isso que, “nesta conexão”, o bem comum, simbolizado como o “Santo Graal”, deve ser a busca de todos nós, e com maior ênfase dos chefes e executivos, cada um em sua “ordem de cavalaria”, na compreensão do poder funcional da cibercultura, para tornarmo-nos o verdadeiro “cavaleiro do Rei Artur”, investindo a plenitude da indumentária do escudeiro, simbolismo das reais características do “líder do Terceiro Milênio”.

O povo brasileiro espera e merece que o espírito de liderança se vivifique em todos os matizes dos órgãos públicos e privados, através de seus diretores. Que o “líder virtual” deixe eclodir o “líder racional” que tem dentro de si, sem perder de vista a potencialidade da Tecnologia da Informação.

Para concluir, ao olhar a estrada da minha existência, vislumbro a silhueta dos meus ex-chefes e ex-comandantes, que marcaram o meu lado profissional, e encerro essas reflexões homenageando-os, reescrevendo o velho jargão que traduz a autêntica liderança: “as palavras convencem, mas o exemplo arrasta”.

Caráter, dever e solidariedade.

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