(Resenha por Fabio Blanco)
O desespero do homem moderno não é fruto de seu materialismo, mas de uma espiritualidade vazia de sentido, que valoriza o místico por ele mesmo, não havendo com quem manter comunhão. Tendo substituído a visão do homem integral pela dissociação da graça e da natureza, o ser humano acreditou ter encontrado a liberdade, mas se deparou unicamente com a angústia. Vivendo uma autonomia sem fundamentos, tornou-se escravo de sua própria liberdade, restando apenas a desesperança de qualquer redenção razoavelmente racional.
Esta maneira de enxergar a vida, lançando para o andar superior um misticismo irracional, completamente apartado da realidade sensível, é a marca do homem de nossos tempos. Para ele, o espiritual se encontra numa dimensão superior, à parte, sendo alcançado somente por meio de um salto mísitico.
De qualquer forma, essa maneira de enxergar as coisas não ocorreu por uma escolha direta, mas era a única alternativa possível para quem perdeu todas as referências. Se antes o céu e a terra se encontravam numa relação medida por símbolos racionais que, a despeito da sublimidade das coisas celestiais, estavam presentes no cotidiano, a partir do Renascimento o paraíso desceu, se confundiu com o pó e perdeu o caminho de volta.
Acontece que o anseio espiritual não se perdeu, mas agora se encontra preso a uma máquina determinista que o sufoca. Acorrentado a um mecanismo sufocante, restou-lhe apenas o salto, um vôo irracional que tenta encontrar o alívio no misterioso, no superior.
Diferente do homem anterior que na racionalidade submetida a Deus exercia seu pensamento livremente, o homem moderno se aprisionou nos cárceres de sua liberdade. Ao trazer o céu à terra, estraçalhou os símbolos que sustentavam sua existência, encerrando-os na mesma cova em que ele se encontrava. A partir disso, as formas clássicas de pensamento não puderam mais responder aos anseios íntimos de cada um e aqueles símbolos que se quebraram precisaram ser substituídos.
A irracionalidade, então, toma o trono celestial. Ela, agora a senhora dos céus, reina absoluta sobre um mundo que a adora. As formas de pensamento tradicionais já não mais respondem aos anseios humanos, não porque não tenha respostas, mas porque o próprio ser humano não crê que elas existam.
O homem, que era integral, que se relacionava com o céu com todo o seu ser, abdicou daquilo que o torna mais semelhante a Deus, que é a sua racionalidade, encerrando a razão apenas ao cotidiano mecânico e utilitário. Para ela foram fechadas todas as portas da realidade superior, permitindo que neste plano ingressassem apenas a vontade e os sentidos.
Não é de se estranhar, portanto, que os filósofos modernos concluam que o homem nada seja e que o próprio Deus haja morrido. Se o andar superior é o reino do irracional, o que importa quem esteja lá? Dessa forma, são alçados para o céu qualquer fé, qualquer deus, qualquer espiritualidade. Se o místico é apenas um escape, não importa se há um objetivo, basta o salto.
A conseqüência final disso é a dúvida inclusive quanto à existência da realidade. Ora, se o céu é o que eu coloco lá, como acreditar que haja uma certa revelação. Com isso, a verdade bíblica já não mais encerra uma realidade plena, mas se transforma em um belo caderno de intenções. Deus, então, assume a forma segundo a vontade de cada um e se desfigura no desespero da humanidade.
O homem integral se desfez em pedaços e talvez não se junte jamais!
Com estes olhos, o homem se enxerga destituído de motivos. Se vê morto, perdido. É um nada, um acaso.
A Bíblia revela, porém, que isso não é verdade. O homem é alguém que, mesmo com sua rebelião, se acha marcado com a imagem e semelhança divinas. Tendo sido criado pessoalmente por Deus, se encontra revestido de uma importância ímpar. Não sendo simplesmente expressão casual do infinito, mas alguém criado no tempo e no espaço, sua importância assume proporções maravilhosas. Não sendo apenas uma engranagem de uma máquina, mas alguém capaz de mudar a história, sua posição no mundo é realçada grandiosamente.
Aos que compreendem isso resta comunicar essa verdade àqueles que se encontram prisioneiros de uma forma de pensar que se acredita livre, mas que não pode fugir de seu próprio pesadelo.
Há esperança para o homem, e ela reside no abandono de seus falsos ideais de liberdade e na submissão a uma liberdade autêntica, que existe no desfacelamento do teto de ferro criado pela autonomia da vontade.
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